segunda-feira, 12 de outubro de 2009
Um breve relato dos acontecimentos no mosteiro Prajña
Por Irmã Chan Khong [Verdadeira Vacuidade]
CARTA AOS POLÍTICOS DO GOVERNO DO VIETNÃ
Plum Village, 26 de junho de 2009
Ao respeitável Ministro do Exterior da República Socialista do Vietnã.
A todos vocês que amam e apóiam os 400 monásticos do Mosteiro Prajña.
Estes jovens monges e monjas, que estão na faixa de idade entre dezesseis e trinta e cinco anos, nasceram no Vietnã e foram educados e nutridos pela República Socialista do Vietnã. Eles estiveram vivendo no Mosteiro Prajña, Hamlet 13, Dambri Village, Bao Loc District, Lam Dong Province desde 2005, quando o nosso professor voltou à sua terra natal pela primeira vez.)
Por favor, deixe-me apresentar algumas informações elucidativas sobre a história do Mosteiro Prajña:
Nosso professor Thich Nhat Hanh – carinhosamente conhecido por seus alunos como “Su Ong”, que em vietnamita significa “Professor Avô” – está agora com 83 anos de idade. O desejo profundo dele para este presente dilema é que o governo vietnamita apóie e não atormente os filhos e filhas do seu próprio país materno, o Vietnã. A única aspiração dos jovens monásticos é praticar a paz e levar uma vida simples de serviço à humanidade e ao povo do Vietnã. A luta atual no Mosteiro Prajña deve preocupar a todos nós e se opõe aos direitos humanos de cada cidadão vietnamita. Nosso professor acredita que se o governo central estiver sabendo deste fato, poderá ajudar a por um fim nesta situação de forma justa.
Nosso professor não tem planos de retornar ao Vietnã mais uma vez, nem está pedindo coisa alguma ao governo vietnamita. Ele não está pedindo terra para estabelecer centros de prática, e já abandonou a idéia de pedir de volta àquela terra que pertencia à School of Youth for Social Service [Escola da Juventude para o Serviço Social]. (Esta terra pertencia oficialmente a SYSS até 1975 e desde então foi ocupada pelo governo). Todos nós temos visto sinais nos últimos anos de que o estado do Vietnã se abriu para mudanças. Nas três visitas à sua terra natal, o nosso professor de 83 anos, com o intuito de construir um belo futuro, tem partilhado com o governo central a sua profunda compreensão das necessidades do país. Ele partilhou tudo o que estava em seu coração e não tem nada mais a acrescentar.
Os eventos que estão sendo aqui partilhados é uma descrição dos atos criminosos cometidos por pessoas corruptas, que abusaram do poder que têm, com a colaboração silenciosa do serviço de imigração governamental e o departamento de assuntos religiosos nacional. Antes de o mosteiro ter sido oferecido ao nosso professor em 2005 pelo monge Duc Nghi com afirmações juradas e gravadas diante de milhares de pessoas, o terreno do templo onde o Mosteiro Prajña se localiza só tinha poucas construções: um pequeno salão de Buda, uma pequena casa de hóspedes, uns dois quartos para monges e uma cozinha de um pavimento com um teto de asbesto, e um prédio de um pavimento planejado para pessoas idosas. Além destas construções, o resto dos 30 hectares de terra estava vazio.
Durante a viagem de volta do nosso professor e da comitiva de Plum Village ao Vietnã, de 12 de janeiro a 11 de abril de 2005, houve muita gente que se entusiasmou para se tornar monástico e praticar meditação de acordo com a tradição de Plum Village. A viagem deixou mais de 80 aspirantes desejosos de se tornarem monásticos, então o monge Duc Nghi ofereceu o templo dele ao nosso professor e para estes jovens aspirantes. Ele celebrou a cerimônia de ordenação e raspou as cabeças deles com suas próprias mãos como representante do nosso professor. Esta propagação de jovens dedicando suas vidas para servir inspirou muitos de nós e trouxe energia positiva e benéfica ao país e aos praticantes budistas ao redor do mundo.
Todos os amigos de várias partes do mundo que apreciavam os ensinamentos de Plum Village se entusiasmaram por este desenvolvimento e se sensibilizaram para apoiar os esforços do monge Duc Nghi de sustentar estes jovens praticantes. Eles começaram a se organizar em suas comunidades para angariar fundos e doações que eram todas enviadas ao templo Prajña para ajudar a prover estes jovens monásticos e desenvolver e construir mais prédios para alojá-los.
Os amigos estrangeiros que seguiam a tradição de Plum Village investiram grandes somas de dinheiro aos empenhos de construir o Mosteiro Prajña. Nós pagamos U$90.000 (noventa mil dólares americanos) para renovar e contribuir com o prédio anteriormente planejado para as pessoas idosas, mas que estava inabitável, com o acordo de que outro prédio para idosos seria construído em outro templo próximo. Nós transformamos este prédio num de três pavimentos que contém um salão de meditação, um refeitório, uma cozinha e dormitórios para cem monjas, que ficou chamado de Prédio Jacarandá. A procura por mais espaço de moradia aumentou com o número de aspirantes e praticantes vindos de toda parte do país e posições sociais. Não podíamos recusar a nobre aspiração e coração puro deles. Na área das monjas, nós tivemos até que espremer 16 pessoas em um único quarto usando beliches de três níveis. Então tivemos que construir um segundo prédio para 100 monges, chamado de Prédio Floresta das Fragrantes Folhas de Palmeira. Mas o número de jovens aumentou tão rapidamente que tivemos que construir uma segunda residência de monjas para outras 100 monjas, chamado de Prédio Salgueiro Verde. Na área dos monges, já subimos outro prédio para moradia de aspirantes homens, chamado de Prédio Mente de Principiante.
Até o final do ano, o número de pessoas aumentou tanto, muito além de todas as nossas expectativas. Com o monge Duc Nghi agindo a nosso favor, nós compramos um terreno adjacente e construímos outro amplo prédio para monjas e membros laicos da Ordem Interser. Nós também renovamos a área da cozinha e a transformamos em um prédio de dois pavimentos com uma cozinha totalmente nova no térreo, uma ampla despensa e refeitório no andar superior. Além disso, nós também construímos um amplo salão de meditação que poderia acomodar milhares de pessoas para meditação sentada e para ouvir o Darma. Estes são os maiores investimentos que os nossos amigos estrangeiros e de casa investiram neste mosteiro, isso sem mencionar as pequenas contribuições que apóiam a manutenção diária e funcionamento deste mosteiro.
Assim como o súbito influxo de jovens no mosteiro, muitos destes jovens monásticos concluíram recentemente o segundo grau. Um número substancial deles tem curso universitário e alguns até mesmo tiveram carreiras bem sucedidas em suas áreas. Mas abandonaram suas carreiras por um propósito mais elevado, respondendo a um chamado vindo de dentro do coração para que vivessem uma vida simples de serviço aos outros com compreensão e amor. Como o monge Duc Nghi ordenou a todos eles em nome de nosso Professor, todos se referem ao monge Duch Nghi como “Si Fu”, que significa “Professor Pai” em chinês. Estes quatrocentos jovens nasceram para a vida espiritual e estiveram praticando no Mosteiro Prajña por toda vida monástica deles – no terreno sagrado onde o monge Duc Nghi se comprometeu a apoiar a prática deles na tradição de Plum Village. Ele agiu em nome deles e do nosso nome ao comprar terreno e construir prédios com o capital de terceiros para eles viverem.
Como conseqüência da sincera prática deles, mesmo após poucos meses ou poucos anos, nós vimos tantos frutos maravilhosos desabrochando em suas famílias. Muitas estórias foram partilhadas – de pais que pararam de bater nas mães, de divórcios que foram evitados, de reconciliações entre membros de famílias divididas. Na medida em que estas estórias foram se espalhando pelo país e ao redor do mundo, muitos outros jovens se inspiraram a seguir a vida monástica e muitos outros vieram para ajudar e doar em apoio ao mosteiro. Nós temos a relação dos recibos destas doações feitas pelo povo vietnamita e pelos patrocinadores estrangeiros de todo o mundo. As intenções desde o início foram deixadas claras e reconhecidas por todos, inclusive a afirmação jurada e gravada do monge Duc Nghi, que o desenvolvimento das propriedades do Mosteiro Prajña era para estes jovens monásticos viverem e praticarem.
Em 2007, durante a sua segunda visita ao Vietnã para celebração de três missas de réquiem ao público em geral por nosso professor e a comitiva de Plum Village, o nosso professor foi convidado a visitar o Presidente do Vietnã. Nosso professor partilhou que ele o visitaria somente se o governo estivesse pronto a ouvir a voz do povo. O Presidente concordou e a reunião entre os dois aconteceu. Durante a visita e diálogo informal, nosso professor fez algumas sugestões que ele achava que ajudaria a melhorar as relações do país internamente e diplomaticamente. Ele preparou uma proposta com dez pontos que incluía sugestões, tais como permitir aos europeus ou americanos de origem vietnamita a retornar ao Vietnã por 90 dias sem um visto, da forma como eles podem entrar em outros países. Ele também sugeriu que estes vietnamitas no exterior tivessem dupla cidadania, e a construção de um monumento em memória do monge Thich Quang Duc, que morreu defendendo o fim da discriminação religiosa sob o regime Diem. Parece que o governo levou adiante praticamente todas as sugestões do nosso professor, fazendo-as mais populares aos estrangeiros e povo de casa, com exceção da última sugestão, que era para dissolver dentro de um período de cinco ou seis anos o Departamento de Assuntos Religiosos e política religiosa.
Parece que as dificuldades com o Mosteiro Prajña podem ser rastreadas até este ponto, a esta última sugestão do nosso professor. É claro que existem muitas outras condições e forças imprevistas e causando indiretamente a virada das intenções e dos eventos, especialmente do monge Duc Nghi. Antes do nosso professor e da comitiva de Plum Village retornarem ao Vietnã pela terceira vez, em 2008 para participar da UNESCO Vesak conference, o monge Duc Nghi partilhou muitas vezes que o Departamento de Imigração tinha pedido permissão a ele para expulsar, do mosteiro e do Vietnã, os monges e monjas estrangeiros de Plum Village, que já tinham obtidos um visto válido. Temos estas declarações de Duc Nghi feitas ao nosso professor e outros professores do Darma de Plum Village gravadas duas vezes.
A tragédia começou a se intensificar no dia 8 de agosto de 2008, quando a polícia nos enviou uma carta afirmando que o proprietário do templo onde os 379 monásticos estavam morando (isto é, o monge Duc Nghi) queria eles todos fora da propriedade, e tinha pedido a polícia para despejá-los, e, de acordo com a carta, os monásticos estariam vivendo ali ilegalmente. Desde aquele dia, a polícia tem vindo quase toda noite checar a identidade de cada monástico, e pedir a eles para assinar um documento que diz que eles estão vivendo ali ilegalmente. Os monásticos se recusaram a assinar estes documentos e permaneceram calmos e amáveis diante disto. Eles sempre falaram gentilmente com os policiais e até mesmo ofereceram chá e canções para eles aliviarem suas tensões. Os policiais ficaram muito envergonhados com a situação, mas não podiam desobedecer as ordens de seus superiores. Com o pedido de ajuda ao governo feita pelo povo, as pessoas vêm esperando por esta inteligente intervenção do governo, mas não obtiveram qualquer resposta.
A partir de agosto de 2008 até hoje, o serviço de imigração não tem dado vistos aos professores de Darma de Plum Village de cidadania não-vietnamita para entrarem no Vietnã. Estes professores de Darma não podem voltar para ensinar estes 400 monásticos que foram ordenados no Mosteiro Prajña desde o primeiro retorno do nosso professor ao Vietnã em 2005. A repartição do serviço de vistos da Embaixada Vietnamita na França até mesmo cancelou o visto de cinco anos dado anteriormente a duas irmãs de Plum Village para visitarem o Vietnã. Nós ainda não protestamos nada disto, e permanecemos pacientes com os líderes do Vietnã.
No dia 13 de novembro de 2008, nós pedimos ao Embaixador do Vietnã em Paris para transmitir 600 cartas de praticantes franceses ao governo do Vietnã, pedindo amavelmente que o governo intervenha na situação do Mosteiro Prajña. A Embaixada apoiou de todo coração este esforço enviando todas as cartas através de email ao invés de através do correio diplomático. No dia 19 de novembro, o governo central organizou uma reunião em Ho Chi Minh City para tentar resolver o problema pacificamente. Após a reunião, muitos monges e dignitários da Igreja Budista anunciaram alegremente para nós que tudo estava bem e que a decisão estava tomada: os jovens monásticos poderiam permanecer e praticar em paz no Mosteiro Prajña, o único lar espiritual deles. Nós pedimos um relato escrito da reunião e da decisão, e eles nos prometeram enviar em breve tal relato. Depois de três meses, o relato finalmente chega, mas nele estava dito o oposto do que tinha sido previamente anunciado como sendo o resultado da reunião do dia 19 de Novembro. Foi dito de forma rude aos 400 monges e monjas que se mudassem do terreno do mosteiro até o dia 29 de abril de 2009. Daquele dia em diante, a entrada do mosteiro tem estado trancada e acorrentada. As pessoas laicas que vem aos retiros de finais de semana são afugentadas.
No dia 26 de junho de 2009, Dong Nanh, um discípulo de Duc Nghi, e alguns outros tentaram queimar as nossas cabanas com telhados de sapé que os monásticos usam para retiros solitários. Como estava chovendo, as cabanas não se incendiaram, então eles usaram picaretas para derrubar as cabanas. Quando um monge e uma monja vieram pedir a eles que parassem, eles os atacaram com as mesmas ferramentas. Felizmente, nós escapamos ilesos por um triz. Uma moça se ajoelhou e implorou aos agressores que a matassem ao invés dos monges. Alguns de nós tiramos fotos destes eventos. Devido à escalada de violência e do perigo a estes monásticos, nós pedimos seriamente ao embaixador que leve isto à atenção do governo central.
Nós compreendemos a fé ingênua de Dong Hanh, discípulo de Duc Nghi, para com o professor dele que por isso o forçou a trilhar este caminho obscuro. O próprio Dong Hanh disse que ele tinha ido longe demais e não podia voltar. Esta é uma afirmação alarmante. Todos nós ainda podemos rezar para que haja esperança e saída para ele se ele tiver a coragem. Existe um grande número de relatos de residentes antigos da província de Bao Loc, onde o Mosteiro Bat Nha está localizado, sobre as ações passadas do monge Duc Nghi, que são semelhantes, mas de proporção menor; contudo, tão erradas e prejudiciais quanto às presentes. Agora diante de nós, pedimos somente para viver e praticar pacificamente em nossa casa espiritual com todos os direitos de qualquer outro cidadão vietnamita.
Em Novembro de 2008, o nosso professor escreveu uma carta ao monge Duc Nghi pedindo a ele para retornar as responsabilidades dele enquanto professor-pai destes 400 jovens monásticos. Nosso professor estava pronto para perdoar e esquecer qualquer erro passado. Nós ainda sustentamos o pedido de nosso professor e estamos prontos a fazer o que for necessário para levar paz ao Mosteiro Prajña, sob a condição de que as vidas destes 400 monásticos sejam salvas.
Semana passada, em um esforço coordenado de propaganda, os chefes de catorze aldeias da vila Dambri anunciaram uma reunião com os moradores para declarar que se o governo expulsa nossos monásticos, é porque os monásticos legalmente ordenados estão engajados em política. Isto seria difícil de provar, pois a maior parte das atividades diárias e anuais dos monges e monjas inclui meditação sentada, cânticos, cuidar do jardim, meditação caminhando e muitas outras práticas da consciência plena. A única intenção deles é viver uma vida simples e pacífica sem engajamento em qualquer atividade política. Tem havido muitos relatos de policiais chamando os pais destes jovens monges e monjas, e pedindo a eles para levarem os seus filhos de volta à vida familiar, e renunciarem a escolha deles de uma vida espiritual. Estes incidentes ocultos nos revelam que isto não é só uma questão interna entre Duc Nghi e nossos monásticos, mas um esforço coordenado por várias forças governamentais, cujos motivos estão se tornando cada vez mais claros a cada evento.
Esta é uma carta pessoal escrita para esclarecer àqueles que conhecem nossa comunidade e nossa situação no Mosteiro Bat Nha. Se algum de vocês ai puderem ajudar nossos irmãos e irmãs com sua conexão e influência, por favor, ajam motivados a partir da compaixão e espírito de reconciliação. Se esta carta puder ser partilhada com o Embaixador Vietnamita na França, Estados Unidos ou Canadá, talvez ela possa ser transmitida a várias autoridades de alto calão do governo central Vietnamita que conhecem nosso professor e amam sim e apóiam estes jovens monásticos. Por favor, estejam motivados a agir.
Com amor e confiança,
CK
[Carta publicada no blog helpbatnha.org e traduzida por Tâm Vãn Lang - O lindo bem estar do coração]